Dentro desses prédios frios
com a mente acelerada pelos megabytes
olhando para essas telas frias
ensurdecido pelo som dos cliques
e tantas conversas frias
corro até a janela
e nessa manhã fria
o canto de um pássaro ao longe
é a única coisa que consegue aquecer meu pensamento
e de repente percebo
que toda a perfeição que os homens procuram nas máquinas
sempre esteve ao nosso redor
disfarçada de natureza.
Tantos anos se passaram
tantos dias já se foram
não faço a mínima ideia de quantos faltam
mas enquanto isso
vou caminhando
aprendendo
repensando
ensinando
chorando
amando
como todo ser humano faz.
Mais cedo ou mais tarde a vida se ajeita
Aos poucos voltamos à velha situação
O novo normal que nunca chegou
Só mostrou o abismo da nossa nação
Quem sempre foi rico, continuou rico
Já os pobres, coitados, mais pobres estão
As contas que chegam têm data marcada
Se o boleto vence, perdeu cidadão
O povo tem fome e quer trabalhar
Discurso de ficar em casa dá não
São tantos problemas que o povo enfrenta
Que o vírus foi só mais um na multidão
Morreram parentes, amigos de infância
Muitos pais de família se foram então
Trazendo a dor, deixando a saudade
Não tinham histórico de atleta não
Nesse fanatismo canhoto e destro
Perdemos amigos, perdemos irmãos
Mais cedo ou mais tarde as máscaras caem
Voltamos à vida de aglomeração
Covid já não é mais a manchete
no rádio, internet ou televisão
O vírus que chega agora é outro
a cada dois anos invade a nação
O vírus que assola esse povo sofrido
não esqueça, amigo, é o da corrupção.
Mais uma noite quente do mês de agosto
Sento em frente à tela para compor um cordel
Estou cansado, dormi muito pouco noite passada
Poderia estar pensando nas rimas que tenho fazer
para satisfazer alguns egos alheios
mas são ossos do ofício
sempre pagarão menos pelo serviço prestado
mas seguirei nessa lida
enquanto aos poucos
descubro novos jeitos
de satisfazer
o meu próprio ego
Ao invés de estar escrevendo isso
poderia ter feito uma ou duas estrofes
mas não tenho pressa
ao mesmo tempo em que o tempo não espera
eu me decidir
que é hora de começar
tanto eu quanto outros
estão acordados a essa hora
digitando suas frustrações
em um post qualquer
de alguma rede
sem a esperança
de ser notado
Assim seguimos a vida
nos arrastando pelos dias
enquanto não encontramos a oportunidade
de sermos o que queremos ser.
No meio do caminho havia uma pedra.
Aliás, haviam várias pedras, espinhos e algumas bifurcações.
Pedras e espinhos sempre há, independentemente do caminho a se seguir.
O que mais atormenta o ser humano são as bifurcações.
Elas certamente são o grande desafio do caminhar.
À medida em que nos aproximamos delas, aumenta a dúvida sobre para qual lado devemos rumar nossos passos.
Uma pena não haver árvores frondosas em que possamos nos recostar e simplesmente observar o momento em que a estrada se divide.
As pernas se movem automaticamente, inexoravelmente levadas pelo relógio dos dias que seguem, dando passadas uma após outra, sem cessar, simplesmente cumprindo sua função na estrada:
a de seguir em frente.
Ao encontrar as bifurcações, o que muitas vezes tememos não é o seguir, mas o que poderíamos encontrar se decidido fosse seguir pela outra mão do caminho.
De qualquer modo, a natureza cumprirá seu curso e acabaremos por seguir por uma dessas trilhas.
Inicialmente receosos, seguiremos andando, novamente colhendo flores, encontrando pedras e espinhos até a próxima bifurcação.
Que inevitavelmente surgirá, enquanto estivermos caminhando.
Mais uma leitura concluída
como um troféu levantado
mais uma lição aprendida
mais um projeto iniciado
a mente de novo expandida
ao som da música do espaço
que me traz à mente uma vida
em que muito sonho, pouco faço
uma guitarra distorcida
um pensamento associado
uma lágrima escorrida
menos um dia contado
a canção que já termina
tem seu som silenciado
mas a emoção sentida
faz o agora eternizado
Muriçoca do cão
quer chupar meu sangue
quer que eu me zangue
e mate ela de um tapa
mas ela não tá nem aí
se morrer, outras virão
pra continuar a missão
de tirar o meu sossego
é um zunido do cão
abusando meus ouvidos
não aguento esse zunido
dessa muriçoca do cão
não tem veneno
não tem fumaça
só tem muriçoca
muriçoca da peste
muriçoca fuleragem
não tem nada pra você
não tem poesia
nem filosofia
já bati tanta palma pra matar muriçoca
que parece festa de aniversário
Hoje em dia muitos querem bukowskiar
porque um dia leram um velho safado
que olhava a vida pelos olhos da ressaca
enquanto outros veem a vida passar
liquidamente pelas timelines alheias
é muito fácil abrir uma cerveja
acender um cigarro, fazer uma live
e arrotar percepções virtuais
de uma vida bohemia
real apenas
para quem está do outro lado da tela
muitos fingem estoicizar
sem saber realmente do que se trata
mas é isso ou se entregar ao complexo de vira-lata
que alimenta muitas almas
nos dias atuais
em tempos virtuais
só falta um like pra quem eu quero ser
Talvez isso tudo seja verdade
ou seja apenas desabafo
de quem está envelhecendo
e acha que sabe tudo
e agora quer ditar como os mais novos devem viver
no mundo deles.
Hoje é tudo mais fácil
é mais fácil saber
é mais fácil ler
é mais fácil aprender
mas também é muito mais fácil se enganar.
Muitos querem ser heróis
Todos querem ser heróis
matar o bandido
levantar o troféu
ser aplaudido
deixar suas mãos na calçada da fama de Hollywood
mesmo vivendo suas vidas de merda
e eu não tenho nada a ver com isso.
Nessa madrugada do caralho
o clima está bom
o silêncio ajuda
o ventilador está funcionando
meu filho dorme
acho que todos dormem
e eu aqui
feito um filho da puta escroto
querendo dormir
e a porra do sono não vem
Bebam seu uísque
bebam sua cerveja
bebam sua cachaça
e arrotem sabedoria
de como resolver os problemas do mundo
enquanto contam as moedas para saber
se vão conseguir
pagar o tira gosto
Nessa vida virtual
é tão fácil
se aproximar das pessoas
pessoas que por acaso estão por aí pelo mundo
que tem gostos parecidos
que curtem músicas parecidas
que tem ideias parecidas
que tem angústias parecidas
e ao mesmo tempo
nesse mundo virtual
onde é tão fácil se aproximar das pessoas
também é tão fácil
nos afastar
dos que estão ao nosso redor
Nesse mundo virtual
o mais difícil
é ser real
Ainda sinto o gosto das lembranças amargas
de uma vida egoísta
que sempre quis
o melhor
para si
mas até hoje
perambulo pelas madrugadas da vida
insone
sem saber
se o caminho que escolhi
é o certo
e receoso de estar enganado
In the blink of an eye
some memories long forgotten
come back
today as ghosts of the past
they still scares me
in the middle of the night
I cannot dream
I'm still awake
I'm not hunger
it's not work
it's a pain
in my soul.
Olho a penteadeira na minha frente
cheia de coisas que pra mim não fazem o mínimo sentido
mas o universo feminino é vasto
misterioso
embora eu sei que isso não tenha a ver
com que estou pensando
a essas horas eu já deveria estar dormindo
mas os anos que se passaram trazem memórias
que eu preferia não ter
porque são coisas
das quais
não
me
orgulho.
O biscoito maisena não é dos melhores
a cama é boa, mas o sono não vem
poderia ser apenas fome
mas não passa
de remorso
Cada segundo que passa não volta
nessa viagem de ida
em que não sabemos o caminho
mas sabemos que é pra frente
e as vezes meio sem querer
no meio da madrugada
quando o travesseiro deveria servir de consolo
é apenas de uma pedra
em que deslizam as lágrimas
de um homem amargurado
Estou eu mais uma vez na madrugada
enquanto o som hipnótico do ventilador é mais forte que o vento que ele produz
nessa noite quente de março
os filhos e a cidade já dormem há horas
em tempos de lockdown
todos já estão quietos há horas
encontraram mais um motivo pra ficar em casa
mas agora o medo cerca a todos
enquanto alguns fingem não temer
até que o temor fatal lhes bata a porta
e leve embora um dos seus
ouço nos fones alguém falar sobre personalidade
e em tempos de internet
onde muitos atuam em busca de fama, dinheiro e putas
no meio de várias vozes
tento fazer a minha ser ouvida
mas percebo que aos poucos
meu discurso começa a ecoar a voz alheia
e antes que me culpe por isso
percebo que ninguém sabe agora
no meio de tanto barulho
quando perderam sua voz no meio da multidão
E se você pudesse voltar no tempo?
O que você mudaria?
Está tudo nos conformes?
Há algo de que se arrependeria?
Fisicamente é impossível
Mas os sentidos nos dão passagem
Ao som da mais simples emoção
Voltamos, por instantes, numa viagem
A momentos que se a gente pudesse
Dava um jeito de eternizar
Mesmo as pequenas desavenças
Hoje sorrimos ao relembrar
Pessoas, entes queridos
seguiram seu destino na vida
uns ainda prosseguem lutando
outros findaram a sua corrida
Se eu pudesse voltar no tempo
Pouco ou nada era diferente
Os erros do nosso passado
é que ensinam o andar da gente.
A vida segue seu rumo
E nós seguimos com ela
Olhando a porta do futuro
Revendo o passado da janela
